sábado, 22 de setembro de 2012

Adicção em nossas vidas

 
Minha vida era feliz, cheios de sorrisos, esperança, desejos e futuros. Tudo estava sob controle, minha família, meus amigos, trabalho, enfim tudo como eu sempre quis que fosse.
Tudo estava sob domínio, leis, éticas, moral, eram correspondidos de acordo com as regras de convivência de uma sociedade e de meus conceitos. Conceitos estabelecidos não eram descumpridos, o mundo a minha volta cumpria seus desígnios, cada ação satisfazia o que era previsto por mim. Hábitos, costumes, tradições não eram rompidas seguindo ensinamentos passados ou adquiridos com as experiências alheias ou experimentos pessoais.
A rotina da vida nos fazia antever futuros imaginados, devaneios e idealismos aguçavam nossas expectativas de vida. Objetivos eram atingidos, programados desde muito cedo, onde depositávamos nossas não realizações em cima das realizações dele, destinos eram traçados para ele e por ele. Determinávamos os rumos a serem seguidos por todos a nossa volta, sem questionamentos ou porquês. Já estavam determinadas decisões, atitudes, comportamentos. Seguíamos o que planejaram para nós e colocávamos em prática o que havíamos planejado para todos.
Tudo obedecia ao percurso natural definido pelo ¨meu universo¨, com a noção clara de um início, meio e fim. Conceitos morais como honra, honestidade, eram correspondidos. As coisas eram ditas imutáveis, problemas, crises eram subjetivas, encaradas de forma a apaziguar ânimos, evitar conflitos.
Tudo seguia preceitos concretizados, aceitos por todos, por mim. Fronteiras definidas não eram ultrapassadas, espaços demarcados por educação, cultura eram solidificados. Responsabilidades eram determinadas por aqueles que tinham a capacidade de decidir, classificações, padrões, separações, classes eram aperfeiçoados, cultivados para que a ordem do mundo a minha volta não fosse subvertida por aqueles que não se enquadravam neste quadro de certezas.
Novas idéias, pensamentos eram implementados, desde que não subvertessem a ordem estabelecida. A vida transcorria de acordo com as leis divinas, onde todos tinham seu lugar, seu tempo, perfeito, exato. Nossos sentimentos, relacionamentos eram regidos por ideais de moral e bons costumes. Comportamentos geriam ações e reações, tudo muito bem explicado e entendido por todos.
A Perfeição era requinte do meu mundo. Nada seria capaz de modificar minhas convicções, pensamentos e meu mundo maravilhoso.
Um dia a Adicção surgiu em nosso mundo, nãos sei de onde veio, como veio. Acreditava que ela havia surgido do nada, pois, não existiam motivos que pudessem fazer com eu esta doença chegasse a minha família. Minha família era perfeita, eu maravilhoso, no mundo por mim falhas ou erros não haviam sido cometidos. Comportamentos foram transgredidos, pensamentos desvirtuados, os alicerces da minha família ideal sucumbiram. Todas as estruturas concretizadas na minha vida começaram a virar conta mim. Segredos começaram a ser desvendados, nossas relações até então firmes; assim eu pensava; começaram a se mostrar extremamente frágeis. Sentimentos estranhos nunca experimentados por mim começaram a aflorar, sentimentos eram semeados, brotavam e floresciam ao meu redor com intensa marca de rancor e ressentimentos. Meus sentidos estáveis, pensamentos estáveis davam origem as instabilidades emocionais. Estas instabilidades causavam desespero, raivas, meu controle havia saído das minhas mãos. Respeitos consolidados foram sendo desrespeitados, limites ultrapassados. Corpos eram mutilados, violentados, palavras duras eram ditas, diálogos eram substituídos por monólogos intensos e sem nenhuma sensatez. Relações rompidas, afastamentos, isolamento começara a serem sentidos. Uma nova lista de Ferramentas começou a fazer parte de minha vida e sendo incorporadas a ela. Desonestidade, ameaças, extorsões, mentiras passaram a fazer parte de meu dicionário e eram provadas, provocadas e exercitadas a todo instante. Este caos agora dominava a minha magnífica família, a minha magnífica vida.
A Adicção colocou frente a frente meus medos, inseguranças, ressentimentos, frustrações com toda a força. Mostrando deficiências que Eu não admitia ter e que Ele; meu adicto; também achava não possuir.
Inimigos fomos nos tornando, barreiras foram sendo levantadas e a rotina serena e cálida que antes determinava minha existência agora se transformará em rotina caótica. A todo o momento um novo momento de uma atitude louca, de insensatez e incompreensão era deflagrado ao meu redor. O Eu perfeito começava a se tornar desconhecido e Ele se tornava algo completamente indefinido, sem sentido, uma incógnita que Eu não conseguia decifrar.
Tudo que havia lutado estava perdido. Transformado em situações de perigo e risco. Diretrizes traçadas por mim se distanciavam dos ideais, do meu imaginário. A realidade me parecia irreal, pesadelo. Minha Paz tão decantada agora se tornara desordem. Choros substituíam sorrisos, brincadeiras se transformavam em brigas. A irresponsabilidade dele era respondida por ações e reações permitidas por mim.
Minha vida perdera sentido, ganhando apenas um sentir, o sentir do Adicto. Ele agora era o centro do mundo e eu percebia o quanto minha ¨Perfeição¨ estava embasada em mentiras, em falsos conceitos. As realidades que me eram mostradas pela Adicção dele retiravam de mim qualquer expectativa de esperança.
Noites passaram a não serem mais dormidas, carinhos não eram mais retribuídos, o meu ¨cuidar¨ foi substituído por ¨vigiar¨. Por mais que tentássemos, por mais que fizéssemos, o progresso da doença dominava sua mente, seu corpo, sua vida. Sua ¨drogadicção¨ transformava minha vida numa ¨droga¨. Tornando-me dependente do dependente, sua ¨cura¨ era minha obsessão e minha compulsão. Seu fracasso meu fracasso. Sua luta passou a ser a minha luta. Sua Adicção minha responsabilidade.
A razão da minha vida perdia força para minha emoção, meus instintos foram sendo extintos, minhas prioridades foram sendo deixadas de lado para pudesse responder sempre ao seu chamado quando fosse necessário.
A Adicção em Minha Vida retirou de mim a alegria que possuía por viver e colocou na minha vida o medo da morte. Colocou a tragédia 24h sob meu olhar. Sua doença me contagiou, me contaminou de suas alucinações, seus delírios, seus desatinos.
Sinto pena dele e sinto tristeza por mim, por saber que tudo que tento para livrar-lhe da droga de nada adianta. Sinto-me indefeso por não poder defendê-lo. Ele é meu maior troféu e não posso desistir dele.
Infelizmente é assim que nos sentimos quando a doença da Adicção recai em nossas vidas.


Fonte:http://www.gruponaranonalegria.org/adiccao.html




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